O Projeto



PROJETO COLÓIDE: EDUCAÇÃO AMBIENTAL TENDO COMO EIXO PRINCIPAL O RECURSO NATURAL SOLO

Profa. Dra. Maria Cristina PERUSI1
Profa. Ms. Erika Porceli ALANIZ2
Profa. Dra. Carla Cristina Reinaldo Gimenes de SENA3
Aline Natasha PEREIRA4
Camila AL ZAHER5
Renata Correia COSTA6

RESUMO: O projeto de extensão universitária COLÓIDE, em atividade desde o ano de 2007, tem como objetivo trabalhar conceitos e conteúdos pertinentes à educação ambiental tendo como eixo principal o recurso natural solo. Para tanto, fez-se necessária a elaboração de materiais didáticos e a criação de alguns espaços específicos: maquete da Bacia Sedimentar do Paraná; maquetes representando áreas degradadas por erosão; perfis de solo feitos com caixas de leite; completo acervo de minerais e rochas; espaço “PEGAR PRA VER”, destinado aos deficientes visuais e o “NATUREZA EM ARTE”. Toda essa estrutura, montada junto ao Laboratório de Geologia, Geomorfologia e Pedologia da UNESP/Campus Experimental de Ourinhos, subsidia discussões durante as visitas monitoradas e previamente agendadas por grupos organizados como deficientes físicos, terceira idade, Lar Santo Antônio (orfanato), alunos e professores, predominantemente da rede pública de ensino e cursos técnicos. Além disso, a partir do ano de 2009, o projeto passou a fazer parte do Núcleo de Ensino da UNESP/Ourinhos. Neste mesmo ano, o Núcleo propôs o Curso de Formação Continuada para Professores da Rede Pública Estadual de Ourinhos/SP, na oportunidade, foi oferecido o minicurso intitulado “O recurso natural solo: educação ambiental inclusiva na escola”.
Palavras-chave: solos, educação ambiental, materiais didáticos, inclusão, formação de professores



1Professora Assistente do curso de Geografia da UNESP/Campus Experimental de Ourinhos. e-mail: cristina@ourinhos.unesp.br
2 Pós-graduanda em Educação pela Faculdade de Educação da USP. e-mail: porcelierika@yahoo.com.br
3Professora Assistente do curso de Geografia da UNESP/Campus Experimental de Ourinhos. e-mail: carla@ourinhos.unesp.br
4Discente do  termo do curso de Geografia da UNESP/Campus Experimental de Ourinhos. e-mail: aline_natusha@hotmail.com
5Discente do  termo do curso de Geografia da UNESP/Campus Experimental de Ourinhos. e-mail: camilazaher@yahoo.com.br
6Discente do  termo do curso de Geografia da UNESP/Campus Experimental de Ourinhos. e-mail: recorreiacosta@gmail.com


1 INTRODUÇÃO

Entende-se que a educação ambiental deve capacitar o indivíduo à plena cidadania, “através da formação de uma base conceitual abrangente, técnica e culturalmente capaz de permitir a superação dos obstáculos à utilização sustentada do meio” (DIAS, 2004, p. 99). Baseado nesse conceito, no ano de 2007 propôs-se o projeto de extensão universitária COLÓIDE, alusão feita às partículas coloidais do solo.
São partículas ativas, portanto, as mais importantes do ponto de vista das trocas químicas, embora de menor dimensão. O paralelismo para com o projeto é feito no sentido de valorizar as iniciativas, por “menores” que pareçam ser, que visam trabalhar a educação como a alternativa mais viável para minimizar as desigualdades e propiciar a inclusão social. Sendo assim, a educação em solos passa a fazer parte do processo de produção do conhecimento geográfico, via educação ambiental.
Este trabalho tem sido desenvolvido junto ao Laboratório de Geologia, Geomorfologia e Pedologia do Campus Experimental de Ourinhos, historicamente com o auxílio da Pró-Reitoria de Extensão (PROEX). No ano de 2009, o referido projeto passou a fazer parte do Núcleo de Ensino desta Instituição, com o auxílio da Pró-Reitoria de Graduação (PROGRAD). O objetivo deste trabalho é manter um espaço permanente de diálogo acerca da problemática ambiental, procurando romper a dicotomia sociedade/natureza, presente em algumas abordagens. Durante as atividades do projeto, foram atendidas mais de 2.800 pessoas, das mais diversas faixas etárias, dentre elas: alunos e professores predominantemente da rede pública de ensino, grupos organizados como a Associação dos Deficientes Físicos de Ourinhos (AADF), Lar Santo Antônio (orfanato) e cursos técnicos.
Para tanto, foi necessário a elaboração de materiais didáticos que subsidiam discussões pertinentes à problemática ambiental, em especial, quadros de degradação do recurso natural solo e exauribilidade dos recursos naturais como um todo. Mais especificamente junto ao Núcleo de Ensino, visa organizar e oferecer oficinas e cursos de capacitação para professores do ensino público, uma vez que é notória a lacuna desse conteúdo nos livros didáticos e, conseqüentemente, na formação dos professores de Geografia e dos alunos.

2 BREVE CONTEXTUALIZAÇÃO DO ENSINO DE GEOGRAFIA NO BRASIL

A formação do sistema de ensino público no Brasil surge a partir da década de 1930, motivada pela industrialização emergente e pelo fortalecimento do Estado-nação. Efetivam-se ações governamentais com perspectiva de organizar, no nível nacional, a educação escolar (LIBÂNEO, 2003). Nesse período, a Geografia caracterizava-se por ser alheia à prática, baseando-se apenas nos fundamentos teóricos, contribuindo para o fortalecimento da recente idéia de Estado-nação, com o objetivo de apagar as formas anteriores de organização espacial como, por exemplo, os feudos (OLIVEIRA et al., 2005).
Na década de 1970, de acordo com Reis (2008), tanto os livros quanto os manuais são considerados por pesquisadores da área como tradicionais e o ensino de Geografia fica reduzido a um vocabulário e a História, como um grande cemitério cheio de datas, vazias de significação. Para o referido autor, entre os anos de 1960 e 1970, “os professores tornaram-se repetidores dos conteúdos do livro didático sem considerar que a História e a Geografia fazem parte de um conjunto maior que são as Ciências Sociais e que o social é o movimento” (REIS, 2008, p. 164). Os livros didáticos tradicionais, no caso da Geografia, geralmente começavam pelo quadro físico, com conteúdos estanques, de forma a desconsiderara o processo de produção do espaço pela sociedade, reforçando a dicotomia homem/natureza (REIS, 2008).

A partir de meados da década de 1970, surgiram os livros de Geografia que se autodefiniam como renovadores, resultado do trabalho de intelectuais de esquerda. Apresentavam uma nova abordagem ao passo em que propunham o ensino crítico da Geografia mediante a análise da sociedade capitalista (REIS, 2008, p. 165).

Nos anos de 1980, houve um movimento de renovação curricular e do ensino de Geografia nas escolas, corrente de orientação trabalhista, cujos esforços estavam centrados supostamente na melhoria da qualidade do ensino, num processo de revisão dos conteúdos e da prática pedagógica. No Estado de São Paulo, essa revisão foi feita pela Coordenadoria de Estudos e Normas Pedagógicas (Cenp), que constitui uma equipe de autores, liderados por pesquisadores de universidades públicas, para realização da proposta curricular para todo o Estado. No caso da Geografia, foram convidados professores da USP, os quais se propunham a efetuar uma revisão metodológica com amadurecimento dos princípios fundadores da disciplina. A discussão dessa proposta “embora não tenha atingido a todos, promoveu uma ruptura no ensino tradicional da disciplina, apontando caminhos diferentes de um ensino apenas transmitido pelo professor, descolado dos movimentos sociais e da realidade social do país” (PONTUSCHKA, 2007, p. 71).
Essa proposta buscava desenvolver nos alunos da disciplina de Geografia:


[…] a capacidade de observar, analisar, interpretar e pensar criticamente a realidade visando a sua transformação. A realidade era concebida como uma totalidade que deveria envolver a sociedade e natureza. À Geografia caberia a compreensão do espaço geográfico produzido pela sociedade, suas desigualdades e contradições, as relações de produção e a apropriação que a sociedade faz da natureza (SÃO PAULO citado por PONTUSCHKA, 2007, p.73).

Na década de 1990, ocorreram mudanças significativas no sistema educacional brasileiro, decorrentes das discussões para a promulgação da LDB/96 e das propostas curriculares dos Estados com a finalidade de gerar novos currículos, seriam estes os Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN). A partir da discussão dessas propostas, o Ministério da Educação e Cultura (MEC) optou por adotar este documento como referência para todo o Brasil (PCN), caracterizando uma política educacional centralizadora, uma vez que os Estados da Federação não poderiam estabelecer os respectivos currículos, como o tinham feito até então. Essa medida visa, de acordo com o referido órgão,


[…] a uma educação de qualidade que assegurasse às crianças e aos jovens brasileiros, mesmo nos locais de infra-estrutura restrita e condições socioeconômicas desfavoráveis, o acesso aos conhecimentos socialmente elaborados e reconhecidos como necessários ao exercício da cidadania (PONTUSCHKA, 2007, p.74).

Quanto ao ensino de Geografia, os PCNs propõem para o ensino fundamental, um trabalho pedagógico que busca “ampliar as capacidades dos alunos de observar, conhecer, explicar, comparar e representar as características do lugar em que vivem e de diferentes paisagens e espaços geográficos” (BRASIL, 1998). Porém, a imposição de um currículo único para todo o território nacional, nos moldes elaborados pelo MEC, traz alguns problemas quanto à abordagem geográfica, pois como aponta Poloni (1998, p. 102):

[…] os conteúdos de geografia de ensino fundamental arrolados nos PCNs propõem conhecer a organização do espaço geográfico e da natureza; utilizar procedimentos da geografia para compreender o espaço, a paisagem, o território e o lugar; entender a linguagem cartográfica. Sobretudo, a imposição de um currículo único para todo o país não leva em consideração as especificidades locais, nas quais os educandos, os professores e a escola estão submersos. Isso, sem dúvida, está negando, na raiz, a diversidade cultural e a complexidade do território brasileiro.

No ano de 2008, a Secretaria de Educação do Estado de São Paulo implementou nas escolas públicas a nova Proposta Curricular do Estado de São Paulo, a qual se baseia numa ação integradora e articulada por meio da adoção de apostilas. Essas apostilas deveriam ser complementares ao livro didático, o que não acontece necessariamente.
Desta forma, constata-se que o ensino de Geografia que é trabalhado nas escolas passou historicamente por diversas fases com características bastante peculiares: hora como ferramenta de legitimação do poder, hora como ciência com conteúdos fragmentados, hora relegado a segundo plano. Nesse sentido, infere-se que a educação em solos, área de interesse geográfico, igualmente sofreu reflexos. Justifica-se assim a importância dessa abordagem, uma vez que identifica-se a inexpressiva contemplação desse conteúdo nos livros didáticos e por entendê-lo como elemento integrador de discussão geográfica.

2.1 Educação em solos no ensino de Geografia

O solo oferece à população tanto possibilidades de cultivo, origem da maior parte dos alimentos e matéria prima, como a base para estruturação de moradias, descarte de resíduos, além de servir como fonte de renda. Apesar de sua importância, contata-se que não só o solo mas os recursos naturais de maneira geral, encontram-se depauperados (ZANATA et al., 2010). Essa afirmação evidencia a relação intrínseca entre os aspectos físicos e sociais que permeiam esse assunto. Por este motivo, destaca-se a relevância da educação em solos uma vez que, apesar de ser um componente do meio ambiente, responsável por desempenhar funções essenciais à manutenção da vida sobre a Terra, é assunto pouco expressivo junto às comunidades escolares, assim como pela comunidade de maneira geral (CIRINO et al., 2008).
Apesar da inquestionável importância deste recurso natural, identifica-se a inexpressiva abordagem desse conteúdo no ensino fundamental e médio. O tema SOLOS ou PEDOLOGIA não encontra-se especificado nas propostas vigentes, seja nos Parâmetros Curriculares Nacionais ou na Proposta Curricular do Estado de São Paulo. Como exemplo, pode-se citar a atual Proposta Curricular do Estado de São Paulo para a Geografia, na qual o conteúdo de solo encontra-se disperso em meio a outros assuntos que, embora pertinentes, não lhe dá o devido destaque e importância:

- série (Ensino Fundamental Ciclo II) - Terceiro Bimestre. Assunto: Os ciclos da natureza e sociedade. Temas: A história da Terra e os recursos minerais e/ou Natureza e sociedade na modelagem do relevo;
- série (Ensino Médio). Terceiro Bimestre. Assunto: Natureza e riscos ambientais assuntos. Temas: Agentes internos e externos. (SÃO PAULO, 2008, p. 47 e 51).

É notória a dificuldade de trabalhar conteúdos como gênese, processos e fatores de formação do solo, composição física e química, classificação e as alterações que a ação antrópica promove no meio. Porém, negligenciar esse conteúdo é relegar a problemática ambiental a um segundo plano. Nessas condições, convém ao profissional de ensino fazer uso de recursos didáticos que ajudem a ilustrar tais conteúdos, nem sempre fáceis de serem apreendidos teoricamente. No que diz respeito à pedologia, uma das alternativas são os materiais didáticos, utilizados como recurso facilitador da relação ensino e aprendizagem.
Para ir ao encontro com a demanda, a primeira etapa do projeto COLÓIDE compreendeu a elaboração de materiais didáticos que visam subsidiar discussões pertinentes à exauribilidade dos recursos naturais, com destaque para os solos.

2.1.1 A utilização e confecção de materiais didáticos como subsídio à educação em solos
Entende-se por recurso didático tudo aquilo que facilite ou colabore com o processo de ensino e aprendizagem. Ao criar situações instigantes e desafiadoras, estimula o pensamento cognitivo. Assim, o uso desses recursos, como subsídio ao ensino de solos, propicia a aproximação sujeito/objeto, de maneira prática e lúdica. Como apoio à teoria, o objeto de estudo ganha forma concreta e se aproxima da realidade do aluno. Essa é uma das funções dos materiais didáticos.
De acordo com Veiga (1991) foi na Escola Tecnicista, década de 1970, que se intensificou a utilização dos recursos didáticos durante as aulas. Essa prática levou à valorização de diferentes formas de ensinar, como artifícios no processo de ensino e aprendizagem. No entanto, o tecnicismo apoiava-se no uso da técnica como uma fórmula revolucionária e auto-suficiente de resolução das questões referentes ao ensino, tornando-se o centro das atenções e ocupando o lugar do processo pedagógico. É certo que o tecnicismo forneceu bases para a elaboração de técnicas de ensino, mas é necessário utilizá-las a serviço do professor e dos alunos, a serviço do processo de ensino e aprendizagem e não o contrário. Dessa forma, quando recursos didáticos são utilizados com a finalidade de subsidiar o processo pedagógico, tornam-se apoio que facilitam a compreensão dos conteúdos teóricos e estimulam percepções sobre o objeto de estudo e sobre as relações onde está inserido.
O ensino de solos, como um processo pedagógico, utiliza-se de técnicas de ensino como uma ferramenta de representação do objeto de estudo e das relações sociais, econômicas e políticas que se estabelecem sobre ele. É nesse palco de transformações que estão inseridos fatores, processos e ações naturais e antrópicas.
Os fatores naturais de formação dos solos são: material de origem, relevo, clima, ação dos organismos e o tempo. Segundo Lima e Lima (2007, p. 01):

O solo é o sustentáculo da vida e todos os organismos terrestres dele dependem direta ou indiretamente. É um corpo natural que demora para nascer, não se reproduz e “morre” com facilidade. Para dar a necessária importância ao solo e protegê-lo, é fundamental conhecer a maneira como se forma e quais os elementos da natureza que participam na sua formação.

Durante seu desenvolvimento, o solo sofre diversos processos: perda, adição, transformação e transporte de partículas, água e ar. Inserido nesse contexto, destaca-se o grande agente transformador, o Homem, que interfere nos processos naturais e modifica a paisagem. Nesse sentido, o ensino de solos é indispensável para a compreensão das dinâmicas naturais e das intervenções antrópicas no meio ambiente, uma vez que mantêm relação direta com a manutenção dos recursos hídricos, os processos erosivos, o relevo, a ocupação humana, agricultura e pecuária, suporte para as edificações, movimentos de massa, entre outros elementos que devem ser trabalhados de forma integrada.
Desse modo, a primeira etapa do projeto COLÓIDE compreendeu a confecção de materiais didáticos para serem utilizados durante as atividades ao projeto, seja no Laboratório, nos eventos científicos, na comunidade ou nas escolas. Os materiais são confeccionados a partir de recicláveis como garrafas PET, caixinhas de leite, potes plásticos, papel, tintas feitas a base de solos, dentre outros. Com esses materiais elabora-se mini-perfis de solo, jogo de damas, maquetes, cartazes, fantoches, macropedolitos e outros (Figura 1).



Figura 1. Perfis de solo feitos com caixa de leite, potes de vidro e garrafas pett

Os tipos de solos predominantes no município de Ourinhos são representados através dos mini-perfis confeccionados com caixinhas de leite (Figura 1); as cores são trabalhadas como um importante elemento na diferenciação dos tipos de solos e horizontes, sendo usadas na fabricação de tintas naturais e aquarelas; as maquetes ilustram a ocupação humana do meio e as conseqüências do uso consultivo do solo; os poemas e objetos do espaço “NATUREZA EM ARTE” (Figura 2) contemplam a exauribilidade dos recursos minerais e a importância da reciclagem; os recursos didáticos adaptados são voltados para o público com deficiência visual “ESPAÇO PEGAR PRA VER” (Figura 3), valorizando as habilidades potencializadas de cada indivíduo, utilizando-as para estimular as percepções quanto às cores, os sons, texturas...



Figura 2. Natureza em arte: materiais do cotidiano feitos com recursos minerais






Figura 3. “Pegar pra ver”, destinado a deficientes visuais

Nesse espaço de produção do conhecimento e de descobertas, os recursos didáticos cumprem o papel de subsidiar de maneira prática e lúdica o ensino de solos, mostrando suas funções, potencialidades e também suas fragilidades, para incentivar o pensamento crítico quanto à apropriação do solo. Através do contato direto com os materiais didáticos, interagindo com eles, os visitantes passam a entender melhor a sua função enquanto cidadãos, que tanto podem colaborar com a manutenção dos recursos naturais como também degradá-los. Sendo assim, espera-se despertar a importância da conservação do ambiente para a manutenção da vida na Terra.

3 O COLÓIDE VAI À ESCOLA

O projeto COLÓIDE, nesses três anos de atividade, passou por várias reformulações, dentre elas, a proposta de levarmos o projeto às escolas. Essa iniciativa justifica-se pela procura aquém do esperado e do desejado por parte das escolas da rede pública de ensino. Uma das alegações dos professores são a dificuldade de transporte e o tempo disponível para atividades alternativas. Desta forma, com o objetivo de levar à escola questionamentos acerca do ensino de solos e de alguns problemas ambientais, além de gerar maior proximidade entre a academia e a comunidade, o projeto COLÓIDE foi à Escola Estadual Esmeralda Soares Ferraz Ourinhos-SP, como parte da Geo-Feira, atividade de intervenção junto à disciplina de Estágio Supervisionado III realizado pelas alunas Camila Al Zaher, bolsista do projeto e Elisabete Farias, discentes do curso de Geografia da UNESP/Ourinhos. Além disso, contou com a participação das demais as bolsistas do projeto.
Nesse evento o COLÓIDE recebeu aproximadamente 500 alunos (400 do Ensino Médio e 90 do Ensino Fundamental Ciclo II), como se pode observar na Figura 4.










Figura 4. Bolsista do COLÓIDE VAI À ESCOLA em atividade com alunos da rede pública de ensino

Em um stand montado para essa finalidade, as bolsistas explicavam e davam bases para o entendimento do conteúdo através da exposição dos materiais didáticos, dentre eles: Tinta de Solo e a Aquarela de Terra representando o espaço NATUREZA EM ARTE; o perfil de solo tátil para deficientes visuais como parte do espaço PEGAR PRA VER; perfis de solo reconstituídos em garrafas pett e com caixas de leite, amostras de rochas e solos (Figura 5).



Figura 5. Alunos da rede pública de ensino em atividade artística com tintas feita com solo. Ao fundo, perfis de solo em caixa de leite

Esses materiais fundamentaram conteúdos teóricos tais como: processos e fatores de formação do solo, propriedades físicas como cor, textura e estrutura, solo na paisagem, erosão rural e urbana e a apropriação desse recurso pelo homem. Dessa forma, avalia-se essa atividade como altamente produtiva.

4 CURSO DE FORMAÇÃO CONTINUADA PARA PROFESORES DA REDE PÚBLICA DE ENSINO

Com o propósito de contribuir para a atualização dos docentes do ensino fundamental e médio, nas áreas de História e Geografia, no ano de 2009, o Núcleo de Ensino da UNESP/Ourinhos, em parceria com a Diretoria Estadual de Ensino do Município (DEE), realizou o Curso de Formação Continuada para Professores da Rede Pública Estadual. Foram abordados diferentes temas da Geografia, tendo como base a Proposta Curricular da Secretaria de Estado da Educação de São Paulo. Inserido nesse contexto, o ensino de solos foi trabalhado no minicurso intitulado “O recurso natural solo: educação ambiental inclusiva na escola” (Figura 6).





Figura 6. Primeira etapa do Curso de Formação Continuada para Professores da Rede Pública Estadual de Ensino


O curso de Geografia da UNESP/Ourinhos pressupõe a formação de profissionais nas áreas de Licenciatura e Bacharelado. Para conclusão da Licenciatura, os alunos realizam estágio de observação e regência, em especial, em escolas da rede pública de ensino. O acompanhamento do estágio constatou as dificuldades enfrentadas pelos professores diante da implantação da política de inclusão. Ressalta-se que, embora necessária, a inclusão muitas vezes não se efetiva de modo a propiciar possibilidades múltiplas de aprendizagem.
A sociedade atual vive uma mudança significativa em relação ao tratamento dado às pessoas com deficiência. Não é mais tolerada a idéia de isolamento ou exclusão das pessoas baseando-se na existência de uma deficiência. Busca-se hoje, o respeito a cada pessoa, independentemente de suas diferenças ou limitações.
A escola tem papel fundamental nessa mudança, pois deve ser o espaço de aprendizagem, mas também de convivência e experiência social. A escola pode, na sua essência, incluir as pessoas e trabalhar para que as diferenças sejam conhecidas e respeitadas. Essas questões são abordadas na legislação brasileira, que reforça a inclusão do estudante com deficiência em todos os níveis de ensino (SENA, 2009, p. 14).

Inserido nesse contexto, é notória a realidade, manifestada em dados estatístico, da eminência de uma políticaeducacional verdadeiramente comprometida com a inclusão:

Na educação especial, os dados do Censo Escolar registram em 1998, 337.326 matrículas em 2006esse número chegou a 700.624, expressando um crescimento de 107% nas matrículas. O número dealunos incluídos em classes comuns do ensino regular cresceu 640%, passando de 43.923 alunos em1998, para 325.316 em 2006 (BRASIL, 2007, p. 10).

Somadas a essas especificidades, comumente identifica-se as dificuldades ao abordar conceitos e conteúdos como gênese, processos e fatores de formação, classificação de solos e rochas e as alterações que a ação antrópica promove no meio. Para Castrogiovanni (2007), sendo o objeto da Geografia o espaço geográfico, a sua percepção por parte do estudante, de maneira dinâmica, respeitando os conhecimentos prévios, pode proporcionar a compreensão das diferentes concepções de mundo e as transformações das sociedades. Sendo assim, convém ao professor utilizar metodologias e criar recursos didáticos que sejam mediadores eficazes no ensino desses conteúdos, que nem sempre são possíveis de serem apreendidos apenas a partir do plano abstrato ou conceitual.
Nesse sentido, a função dos materiais didáticos é permitir o contato direto com a realidade rica em detalhes e informações, no sentido de trabalhar concretamente os conteúdos para que os resultados sejam maximizados. No caso do minicurso em questão, ao serem elaborados preferencialmente pelos interessados imediatos, devem ser pensados como potencializadores de capacidades e não nos comprometimentos decorrentes das diversas patologias. Por exemplo, o deficiente visual tem no olfato, audição e no tato os canais para interagir e “ver” o mundo. Sendo assim, trabalhar textura, estrutura, escala, matéria orgânica em diferentes estágios de decomposição, terra seca e molhada, ruídos abrasivos ou não, etc., surgem como eficientes recursos na relação “ensino para aprendizagem”, em especial, mas não exclusivamente, para a educação de pessoas com deficiência.
Contextualizado dessa forma, entende-se que o solo pode ser um elemento integrador e norteador das discussões no contexto da educação ambiental, entendida aqui como uma “dimensão dada ao conteúdo e a prática da educação, orientada para a resolução dos problemas concretos do meio ambiente por meio de enfoques multidisciplinares e de uma participação ativa e responsável de cada indivíduo e da coletividade” (DIAS, 1994, p. 26).

4.1 Procedimentos metodológicos

O Curso de Formação Continuada teve como público alvo doze professores da rede pública de ensino, dos anos finais dos ensinos fundamental e médio, com formação nas áreas de Geografia e História. A carga horária do evento foi de trinta e duas horas. O minicurso “O recurso natural solo: Educação ambiental inclusiva na escola” foi desenvolvido em oito horas, com duas etapas de quatro horas cada. Na primeira delas, foram feitas algumas considerações acerca da política pública de Educação inclusiva no Brasil e uma breve contextualização dos pressupostos teórico-metodológicos da Pedagogia histórico-crítica. Em parceria com profissionais da Associação de Assistência ao Deficiente Físico de Ourinhos (AADF), foram feitas atividades de sensibilização acerca do tema (Figura 7). Com o objetivo de recriar o cotidiano de deficientes, os professores usaram cadeiras de rodas, foram amordaçados e usaram vendas nos olhos. Além disso, tiveram que realizar tarefas como ir ao banheiro comum, xerocar documentos, etc. Essa atividade foi fundamental para que os docentes pudessem se colocar no lugar do outro, e perceber o valor de auxiliar o aluno com deficiência na conquista da autonomia.






Figura 7. Atividade de sensibilização: AADF, monitores e professores da rede pública de ensino

Num segundo momento, foram abordados conteúdos pertinentes à temática solo e ambiente: gênese, processos e fatores de formação, principais propriedades físicas e químicas, classificação de solos e rochas, erosão, perda da fertilidade, etc. Munidos do referencial teórico, num processo de construção do conhecimento, o grupo foi orientado a elaborar materiais didáticos para serem usados em aulas práticas (Figura 8).





Figura 8. Professores em atividade prática

Foram reconstituídos perfis de solo em tubos de ensaio e papel A4; tinta de solo; trabalhou-se com solos de diferentes texturas: arenosa e argilosa; simulou-se erosão hídrica em solo com e com cobertura vegetal; identificaram-se rochas sedimentares, magmáticas e metamórficas (Figura 9).




Figura 9. Materiais didáticos produzidos pelos professores

5 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Especificamente no que diz respeito ao curso de formação continuada para os professores, durante os minicursos, houve um esforço no sentido de manter um espaço de diálogo entre docentes da universidade e da rede pública, com o objetivo de promover uma leitura integrada da paisagem, além da atualização de bases e conceitos.
No minicurso “O recurso natural solo: educação ambiental inclusiva na escola”, o processo de elaboração dos materiais didáticos foi ao encontro com os objetivos inicialmente propostos, dentre eles, romper com a dicotomia teoria/prática, que deve contribuir para tornar mais atraente e eficiente a educação em solos, inserido no contexto da educação ambiental. Além disso, inserir o assunto “inclusão” na dinâmica da sociedade e da natureza, pilares que sustentam o saber geográfico, mostrou-se altamente pertinente para a proposta do trabalho, uma vez que a realidade dessa lacuna reflexiva ficou, desde o início, muito clara na fala dos professores e dos monitores que acompanharam as atividades.
A experiência da educação em solos, no contexto da educação inclusiva, permite afirmar que este recurso natural é, por excelência, material integrador, na medida em que faz parte do cotidiano da maioria das pessoas, é a principal fonte de alimentos e matérias primas, além de base para edificações e descarte de resíduos. Apesar dessa condição, o universo pedológico vem rebuscado de conceitos e conteúdos importantes, porém, difíceis de serem compreendidos teoricamente. Sendo assim, converter essa linguagem na forma de materiais didáticos, certamente contribui para potencializar o ensino no sentido de criar uma relação de produção do conhecimento, comprometida verdadeiramente com a inclusão.
Desta forma, acredita-se que o projeto de extensão universitária COLÓIDE cumpre o seu papel: o de aproximar a academia e a comunidade. Porém, entende-se que ainda há muito por fazer e essa é nossa principal motivação.

6 AGRADECIMENTOS

À Pró-reitoria de Extensão (PROEX), à Pró-Reitoria de Graduação (PROGRAD) e ao Núcleo de Ensino da UNESP/Campus Experimental de Ourinhos, pelo apoio ao projeto.

7 REFERÊNCIAS

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